Santo Antônio de Sá: Primeira Vila do Recôncavo da Guanabara
A Exposição apresentou os resultados do Programa de Resgate do Patrimônio Arqueológico, projeto originado pela implantação do COMPERJ (Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro) no município de Itaboraí e baseado na parceria entre a Petrobras, a Sociedade de Amigos do Museu Nacional e o Museu Nacional/UFRJ.
O objetivo do projeto foi o diagnóstico da área de implantação do COMPERJ com vistas à identificação, caracterização e salvamento dos sítios arqueológicos existentes na extensa região entre os rios Macacu e Caceribu, tendo como núcleo as estruturas da extinta Vila de Santo Antônio de Sá às margens do rio Macacu no Recôncavo Guanabarino.
Erguida no século XVII, a Vila de Santo Antônio de Sá e toda a região atingiram seu apogeu durante o século XVIII com as alvissareiras notícias da possível existência das Novas Minas localizadas em Cachoeiras de Macacu e com o desenvolvimento da cultura açucareira.
A partir de 1830, a Vila de Santo Antônio de Sá entrou em declínio em consequência de grave epidemia de “febres paludosas”, que, originadas nas margens do Macacu, estenderam-se por toda a região. Além disso, a construção da estrada de ferro, estabelecendo outros roteiros para o interior, ocasionou a perda de boa parte da sua importância comercial. Em 1863 a vila seria extinta.
A cultura material apresentada na exposição, fruto do resgate nos diferentes sítios arqueológicos, permite-nos conhecer a história da ocupação dessa região, que remonta à cultura dos sambaquis (grupos de pescadores-coletores que habitaram a região há pelo menos 5.000 anos), às aldeias de grupos ceramistas e aos assentamentos no século XX: artefatos de conchas, restos de utensílios (“tralhas”) de cozinha; tigelas rituais funerárias dos Tupi; faianças, vidros e metais de origem europeia fabricados entre os séculos XVI e XIX; e fragmentos cerâmicos que remetem à presença de grupos de origem africana e seus descendentes e às práticas agrícolas da cana-de-açúcar. As pesquisas arqueológica e histórica forneceram subsídios para a compreensão das relações entre diversos grupos sociais em contato através dos séculos: índios, franceses, portugueses, espanhóis, africanos, colonos, missionários, naturalistas, viajantes, autoridades civis e eclesiásticas durante a Colônia e o Império.
Todo esse trabalho trouxe luz para a grande relevância de uma área que guarda vestígios culturais, econômicos e sociais não só de Itaboraí e do leste fluminense, mas também do Rio de Janeiro e do próprio Brasil. […]
A exposição recebeu aproximadamente 13.100 visitantes.
“A Vila de Santo Antônio de Sá e o Resgate do Museu Nacional”
A remontagem da Exposição Santo Antônio de Sá, inaugurada no dia em que o incêndio do Museu Nacional completou um ano, tem um significado muito particular: essa edição agrega o acervo de diferentes projetos de pesquisa do Museu em sítios arqueológicos no Estado do Rio de Janeiro, os quais foram recuperados dos escombros. O trabalho de resgate vem sendo realizado, desde então, por uma incansável equipe que reúne pesquisadores, técnicos e alunos.
Esse resgate consistiu em retirar novamente do solo, dessa vez sob as ruínas deixadas pela recente tragédia, parte do acervo da exposição “Entre Dois Mundos”, que estava montada na Sala dos Embaixadores [no Palácio de São Cristóvão] e incluía importante testemunho da luta dos indígenas, dos portugueses e dos franceses em Araruama. Além disso, a exposição apresenta fragmentos de levantamentos de outros projetos multidisciplinares, realizados em sítios arqueológicos de diferentes áreas do Rio de Janeiro (Ilha do Governador, Manguinhos e outros), que estavam alojados na reserva técnica do Museu e também foram queimados.
Trata-se, portanto, da reunião de acervos de diferentes levantamentos arqueológicos, o que agrega ao conjunto um valor simbólico, uma vez que demonstra o renovado e contínuo esforço pelo conhecimento. Desse modo, pode-se compreender melhor o que significa, para a arqueologia, o trabalho de um novo levantamento desse material, que permite um olhar não apenas sobre a história brasileira mas também sobre o próprio papel do Museu, condizente com a sua vocação original de pesquisar e divulgar.
Esse rescaldo das peças entre as ruínas é, também, um aprofundamento das raízes e da ressignificação desses acervos, para buscar “no meio das cinzas”, como observou a professora Cláudia Rodrigues, “o futuro do Museu”. Metonimicamente, o trabalho de resgate pode ser visto como a arqueologia do próprio imaginário popular, no processo de reconstrução como símbolo do sentimento nacional.
“Reunir” esses diferentes acervos por tantas formas antes inimagináveis contribui, portanto, para o fortalecimento da identidade brasileira, pela qual o Museu Nacional se insere no país e no mundo, como um símbolo de resistência da instituição.